Formato de Ritual

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Texto de thelettuceman do  Lārhūs Fyrnsida.
Tradução de Eohwine Osbeorþing.
Revisão de Seaxdēor

A posição do  Lārhūs Fyrnsida é de que o culto politeísta no âmbito privado fornece a pedra fundamental para uma prática religiosa estável. Em casos históricos de ofertas públicas, templos, e a maioria de certas religiões civis antigas eram fundamentados por suas próprias formas a partir da – e do estabelecimento da – prática doméstica, simplesmente numa escala maior. O estabelecimento de um culto da lareira ou culto doméstico (hearth cult) é então considerado o exercício individual mais importante que um heathen pode fazer religiosamente. Ao estabelecer seu lar/residência (household) – o lar(eira) (hearth) – e cuidar de suas divindades familiares e estar presente como no papel de intercessor familiar, a base comum então está estabelecida para uma maior ramificação orientada para a comunidade.

A casa é considerada um verdadeiro microcosmo religioso. Ela historicamente combinou ambos o mundo religioso com o edifício físico, incorporando assim as ideias de um culto familiar e bem estar. Considerada uma imago mundi, a  casa é uma imagem do cosmo e o culto doméstico é a continuação natural de  uma das práticas religiosas mais arcaicas. Por causa da natureza sagrada do espaço cercado da casa representando tudo que é importante no dia-a-dia funcional de uma vida religiosa saudável, a importância da casa é mantida até mesmo nos períodos tardios. A casa individual, com o chefe de casa como sacerdote de facto, era capaz de diretamente engajar com o divino.

O que segue é um guia introdutório prático e básico para os interessados em estabelecer sua própria prática doméstica como Þingere, ou sacerdote da família. O ritual é colocado dentro do contexto da tradição do fyrnsidu que o  Lārhūs Fyrnsida adota.

A tradição do culto doméstico tem como seu princípio que o domicílio é um local separado (enclosure) sagrado, mas existem no entanto locais que são específicos para a veneração das entidades da casa e os ancestrais divinos. Esse lugar é o Wīġbed, e constitui o equivalente ao altar da família.

Talvez a forma mais fácil de se montar um ġbed seja reservando uma pequena mesa, estante, criado mudo ou prateleira na parede. A forma e o tamanho devem ser de escolha individual e deve ser levado em consideração os seus requerimentos logísticos. Em outras tradições politeístas, esse local era próximo a lareira, na cozinha ou a lareira central, no entanto os ambientes modernos fazem isso ser menos necessário.

O Local do altar deve levar em conta estas considerações quando possível:
  • que não esteja montado muito distante de seu caminho de forma que possa ser esquecido. É o centro espiritual da casa e deve ser tratado de acordo.
  • que não esteja obstruindo passagem de forma que seja derrubado ou desarrumado ao longo do dia-a-dia de uma casa funcional. Este espaço é efetivamente dado aos deuses do lar, e representa o espaço deles em sua casa.
  • espaços limiares, tais como cantos, devem ser considerados, uma vez que o ritual é um ato liminar que ocorre “entre” o nosso reino e a realidade divina dos deuses. Uma parede no canto leste da casa pode ser também considerado.

Exemplo de ġbed anglo-saxão, foto da internet.

Certas peças de mobília já consistem naturalmente de bordas definidas que isola eles de outras partes da casa. Mesas, estantes e armários (com ou sem portas) todos consistem desta característica. O que estas peças fazem é definir o espaço, e criar condições de uma separação delineada, que é condutivo para a manifestação do numinoso. Não deve ser negligenciado o fato de que este espaço é dado aos deuses e não deve ser usado para guardar ou manter outras coisas ou objetos profanos que não têm intenção ritual. Deve ser mantido em ordem e sempre limpo.

A prática do culto doméstico dentro de seu lar (hearth) pode ser complexo ou pode ser simples, da forma que a casa deseja que seja. Duas famílias nunca vão manter a mesma fórmula para sua prática familiar, e novas considerações devem ser desenvolvidas com o tempo. Isso inclui as ferramentas usadas dentro do culto da lareira ou culto doméstico (hearth cult) e em seu wīġbed.

No entanto, as ferramentas básicas do heathen dentro de seu culto da lareira ou culto doméstico devem ser consideradas desta forma a seguir:

Clǣnsungfȳr (Chama Purificante):
Muitas casas modernas e apartamentos não são equipados com uma lareira (hearth) funcional. As religiões indo-europeias são tradições centradas em torno da chama sagrada do fogo da lareira, e altares caseiros seriam igualmente localizados próximos dela. A centralidade desta chama sagrada é usada como foco de culto até mais tardiamente com a introdução de ícones e estatuária representando o divino.

Ao invés da lareira, uma lamparina sagrada, uma vela votiva (baixa e grossa) ou comprida, ou outra fonte de chama que possa ser uma alternativa para o requerimento de uma chama sagrada. Elas devem ser acesas no ġbed durante o ritual.  Elas não só fornecem uma representação da tradicional chama sagrada, mas é útil de forma a estabelecer o espaço sagrado através da circum-ambulação, reencenando a cosmogonia sagrada que delineia o espaço do outro [isto é, do que é externo] para o ritual.

Offrungdisc (Prato da Oferenda):
Um pequeno prato ou tigela rasa que é usado como receptáculo para as ofertas de comida, bebida e outros. Isso permite que a família divida as oferendas diretamente de suas refeições para os ancestrais e deuses.

Rēcelsfæt (Incensário):
Apesar das mais formas comuns (e de mais fácil uso) de incensos (rēcels) serem os de  palitos e cones, incenso tradicionalmente transformado em pó ou resina era jogado no carvão em brasa para oferecer uma fumaça perfumada para os deuses. Use o que for apropriado para o espaço.

Estes itens constituem o mínimo do material requerido para aconteça o culto doméstico. O indivíduo é livre para adicionar iconografia (representações dos deuses domésticos, fotos de ancestrais), itens votivos e quaisquer itens pessoais de cunho ritualístico que são de importância da casa, da forma que ele preferir.

Daqui para frente, vamos estabelecer as partes, momentos e elementos rituais que fazem parte da oferta na lareira in toto. Ambos rituais mais longos e os mais curtos e diários são considerados.

O Formato do Ritual

Um ritual básico mantám os seguintes passos, derivados de fontes comparativas, uma vez que os rituais germânicos de natureza privada estão perdidos a nós.

Um nota sobre a postura corporal: O Lārhūs Fyrnsida abraça a ideia histórica já comprovada que os povos germânicos faziam a genuflexão (ajoelhavam-se) durante seus rituais como uma forma de demonstrar reverência. É encorajado ajoelhar-se quando estiver dirigindo-se ao divino, não é necessários se  o local do seu ġbed estiver fora de alcance prático.
Uma nota sobre a cobertura da cabeça: É comum em algumas práticas politeístas cobrir a cabeça em sinal de respeito, no entanto, não é de conhecimento se os germânicos faziam isso de forma a apenas imitar outras tradições ou por reverência. Cabe ao Þingere decidir o que é mais apropriado ao seu lar ou lareira (hearth).

Clǣnsung (Purificação):
Anterior à comunhão, o Þingere deve realizar um rito de purificação nele e nos demais e todos os participantes devem remover poluidores mundanos. Essa purificação pode ser simples ou complexa, conforme o que o Þingere julgar necessário. Uma simples lavagem de mãos e olhos podem ser suficientes em algumas circunstâncias, em outras um banho repleto de orações de purificação  pode ser necessário. No fyrnsidu, a água tem uma importância chave no papel de liminaridade e dessa forma ela é uma das ferramentas mais ideais para dispersar os poluentes acumulados do profano.

Hālgung (Consagração):
Assim que o Þingere estiver livre de poluidores, o rito da consagração do ġbed pode ser executada. Tradicionalmente, a demarcação do espaço sagrado era feita através da circum-ambulação em sentido horário com o fogo. Numa situação interna, esse método pode ser replicado com o uso de velas sendo movidas em forma de círculo no ġbed, uma vez que o rito emula a cosmogonia, esse movimento circular deve estar atrelado à obra geral.

Por exemplo, o Þingere pode optar por fazer sete rotações simulando a criação dos sete mundos, como expresso no Encantamento das Nove Ervas. Múltiplos de 3 também têm um papel importante na cosmologia germânica, como no Æcerbot. Ambas formas podem ser empregadas como guia para determinar o número de rotações apropriado para a prática do lar(eira) (hearth) de uma pessoa.

Forespræc (Prefácio):
Assim que o ritual de purificação e demarcação do espaço estiverem completos, o Þingere pode então se dirigir às entidades que são convidadas para testemunhar o sacrifício. Os passos são como se segue:
  • o Þingere solicita a Wada-Þerscold, ou outra entidade apropriada de sua escolha que permita a a comunhão divina acontecer.
  • Rēcels (incenso) é oferecido a Wada-Þerscold junto com orações e então as súplicas.
  • Solicitações são feitas a Friġ-Heorþmodor, ou outra divindade lareira (hearth) para que entregue as ofertas a quem o ritual foi dirigido.
  • Friġ-Heorþmodor recebe orações e ofertas (mais rēcels podem ser acesos, libação pode ser deixada, grão incinerado e etc.) em agradecimento por fazer seu papel dentro do rito.

Hālsung (Súplica):
A hālsung constitui o corpo do ritual e os passos são os seguintes:
  • o Þingere recita uma oração dirigida a entidade que será honrada.
  • o Þingere então diz a razão pela qual a oblação esta sendo feita e o que será ofertado.
  • e então, o Þingere expressa o que é desejado/ansiado da parte da entidade em retorno pela oferta.

Ġifu (O Presente):
Assim que a hālsung é completada, o Þingere deve então dar as ofertas que foram prometidas para a entidade/entidades.

Endespæc (Discurso Final):
Após as oferendas serem entregues, declarações finais podem ser feitas, agradecendo e apreciando as divindades invocadas. Wada-Þerscold deve ser chamado mais uma vez pelo Þingere para fechar os portões e então, finalizar o ritual.

Ritos Diários

O formato acima é a apropriado para rituais mais longos e envolventes. Para o ritos diários, o Þingere pode optar por formas curtas e menos formais do rito usando o formato de oração expresso em Prayer in a Fyrnsidu Context. Nestes ritos menores, uma porção da refeição da família pode ser compartilhada, incenso pode ser queimado, funcionando como formas efetivas de ofertas sem a necessidade de um longo rito.

É encorajado que o praticante do fyrnsidu molde suas práticas para seu próprio lar ou lareira (hearth).
Estas lhes são providas, não simplesmente como uma posição oficial desta prática, mas como uma série de guias para auxiliar e informar praticantes do culto do lar ou lareira (hearth cult) e de religiosidade doméstica dentro de um sistema politeísta.

Referências:

Ken Dowden, European Paganism: The Realities of Cult from Antiquity to the Middle Ages, New York: Routledge, 2002.
Claude Lecouteux, The Tradition of Household Spirits: Ancestral Lore and Practices, Rochester, Vermont: Inner Traditions, 2000.
Mircea Eliade, The Sacred and the Profane: The Nature of Religion, ed. Williard R. Trask, Orlando: Harcourt, Inc., 1987.
Marcel Mauss, The Gift: Forms and Functions of Exchange in Archaic Societies, trans. Ian Cunnison, London: Cohen & West, 1966.
Karen Louise Jolly, Popular Religion in Late Saxon England: Elf Charms in Context, Chapel Hill: University of North Carolina Press, 1996.
John Scheid, “Roman and Animal Sacrifice and the System of Being” in Greek and Roman Animal Sacrifice: Ancient Victims, Modern Observers, eds. Chr. Faraone, F.S. Naiden, Cambridge, 2012.

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