Diferenças entre os paganismos saxão, anglo-saxão e escandinavo

maio 14, 2018

Penda da Mércia: último cyning heathen dos anglo-saxões

Alguns podem ficar confusos e achar que os paganismos escandinavo e anglo-saxão são exatamente iguais, com apenas o nome das divindades mudando. Na verdade, havia bem mais que isso de diferença na religião das ilhas britânicas, praticada entre aproximadamente os séculos V-VIII, e aquela praticada até por volta do século XI na Islândia. 

Os anglo-saxões são uma junção de principalmente quatro povos: anglos e jutos vindo o que hoje é Dinamarca e mais tarde seria habitada pelos daneses, saxões do norte do que hoje é Alemanha, além dos frísios da Holanda. Eles praticaram o paganismo naquelas regiões por alguns séculos e o levaram para a Grã-Bretanha quando para lá se mudaram; todavia, nem sempre o paganismo saxão continental registrado possui semelhanças com o anglo-saxão das ilhas. Todavia, ambos tinham mais semelhanças do que em relação àquele dos nórdicos, que habitavam Dinamarca, Noruega, Suécia e posteriormente Islândia. A maioria desses pontos foi resumida por Robert Sass, um heathen reconstrucionista dos antigos saxões continentais, os quais eu complementei.

Vamos resumir as diferenças:

1. Os daneses veneravam os Æsir e os Vanir, os anglos e saxões veneravam apenas os Ēse. (Grundy, Stephan (1998). "Freyja and Frigg" em Billington, Sandra e Green, Miranda (1998). The Concept of the Goddess. Routledge. ISBN 0-415-19789-9.)

2. Os saxões e anglos veneravam Ēostre (inglês antigo) ou *Ōstar (saxão antigo), os daneses não a conheciam.

3. Os saxões tinham *Sassnōth (ou Seaxnēat em inglês antigo) e os anglos tinham uma deusa chamada *Hrēða, os nórdicos não conheciam essas deusas.

4. O Calendário Nórdico (da Alþingi da Islândia no ano de 930 dC) é muito diferente do Calendário Anglo-Saxão, registrado por Beda em sua De Temporum Ratione no ano de 725 dC.

5. Diferentes Dias Sagrados, bem como um calendário diferente. Os saxões veneravam Ēostre em uma lua cheia (da Lua-de-Ēostre) para celebrar o início do verão. Os nórdicos fizeram Sigurblot (ver capítulo 8 da Ynglingasaga). Os nórdicos fizeram o Dísablót nas Noites de Inverno, o começo do ano e o inverno. Os saxões fizeram um Idisablod na Modraniht que foi o ano novo de anglo  e saxão. Existem muitas diferenças entre os dias santos, apenas listei uns poucos aqui, mas vou adicionar mais um no ponto 6.

6. Quando os saxões e anglos fizeram Blod Moon, os nórdicos estavam fazendo Álfablót. Compare a Saga de Kormak com De Temporum Ratione de Beda.

7. Os saxões e anglos comemoraram o Meio-Verão, os nórdicos não. Os saxões e anglos chamavam isso de Líða. Por favor note, os nomes das luas são diferentes no calendário nórdico daqueles dos anglos e saxões, com a única exceção de uma lua: Ylir é a lua nórdica de Yule, os saxões/anglos tinham duas luas de Giuli. Ylir é Yule para os nórdicos, Giuli é Yule em inglês antigo.

8. Os saxões e anglos tinham Uurd (saxão antigo) (ou Wyrd em inglês antigo) e Modeladoras (giscapou). Os nórdicos tinham Urðr e três Norns. A palavra "Norn" ou "Nornir" não tem paralelo em inglês antigo ou saxão antigo.

9. Os nórdicos tinham 9 mundos, os anglos e saxões tinham 7 mundos. Veja o Encantamento das Nove Ervas, um encantamento em inglês antigo encontrado no Lacnunga.

10. Baldr (nórdico) era conhecido como Baldag ou Bældæġ para os anglos e saxões e não era um deus, mas um filho humano de Uuoden (Woden ou Odin). Veja as genealogias de Wessex, Kent, Bernícia e Deira. Veja também que Baldag é mencionado no Prólogo da Edda em Prosa: “Bældæġ, a quem chamamos de Baldr: ele tinha a terra que agora é chamada de 'Westfália'”. Veja o Chronicon Lethrense e Saxo Grammaticus em seu Gesta Danorum. O Chronicon Lethrense afirma que o Baldag foi um ser humano morto por um rei saxão chamado "Hoðer" com um longo sass/seax chamado "visco".

11. Os nórdicos tinham a ponte Bifrost. Os saxões e anglos tinham o uueg (saxão antigo) ou weġ (inglês antigo), o "caminho". Foi uma estrada entre os sete reinos.

12. Os nórdicos e apenas os nórdicos tinham Valhǫll e vakyrjur, que são retratadas em algumas passagens como donzelas passíveis de serem desposadas por humanos. Os saxões e anglos tinham a wanga ou a uunaga, que era o paraíso deles. No cristianismo nativo dos anglo-saxões também aparece Neorxnawang, o que era possívelmente uma noção de paraíso pré-cristã sendo cristianizada. Os anglo-saxões tinham as Wælcyrian que eram bruxas assassinas extremamente temidas e nada romantizadas.

13. Os nórdicos têm Ragnarǫk como o "fim", por assim dizer, no qual criaturas do reino de Musspell viriam à terra dos deuses atear fogo no cosmos. Os saxões e anglos tinham mudspelles, um julgamento final.

14. Enquanto Wōden (anglo-saxão) e Óðinn (nórdico) podem ser ambos considerados deuses relacionados com a magia, Wōden aparece especificamente ligado com a medicina arcaica da Inglaterra e o conhecimento herbal. Wōden se pendura numa árvore por nove noites para descobrir as ervas fille e finulle (tomilho e erva-doce?), já Óðinn se pendura em Yggdrasill faz para descobrir runas.

15. Os antigos nórdicos parecem ter tido reverência por uma árvore mitológica chamada Yggdrasill, que ligaria os nove mundos, já Einhardt em Vita Karoli Magni e os Anais Francos citam Carlos Magno cortando um tronco ancestral dos saxões continentais, pelos quais eles tinham grande veneração, o Irminsûl. Roberto de Fulda em sua Translatio Sancti Alexandri traduz Irminsûl por columna universalis ou coluna universal, um "tronco de madeira [...] erguido alto sob o céu" e assim chamado "como se estivesse apoiando todas as coisas".

16. Os nórdicos parecem ter feito uma distinção entre Frigg e Freyja, segundo Snorri Sturluson, embora suas características sejam complementares e dificilmente distintas completmente. Na Inglaterra nós encontramos apenas Fríġ que parece ter reunido qualidades de ambas. Todas parecem ter derivado de uma divindade proto-indo-europeia anterior, *Pryia, "amada", sendo o culto tardio nórdico o responsável pela separação dos dois aspectos da divindade e seu culto separado.

17. Os anglo-saxões parecem ter visto alguma sacralidade na função do cyning, o líder religioso-político-militar dos tempos pagãos que grosseiramente entendemos como rei por causa de seu extenso domínio; tal imagem ainda é visível longamente através do cristianismo através de figuras como o rei Ælfréd, o Grande. Os noruegueses colonizam a Islândia principalmente em oposição à tirania de reis cristãos como Harald Cabelo Belo, e eles próprios organizavam-se em unidades tribais que concentravam menos poder, lideradas por um líder religioso-político-militar menor, regional, o goði.

19. A moralidade dos elfos era amplamente diferente. Os álfar são criaturas associadas à ancestrais e Freyr entre os nórdicos, reguladores da Sól e habitantes de um dos mundos superiores em Yggdrasill. Em muitas passagens das Eddas os álfar são listados ou mencionados junto dos Æsir, e eles são muito difíceis de se distinguir dos Vanir. Já os ylfe da Inglaterra são essencialmente criaturas maléficas, que podiam disparar um ælfġescot (tiro de elfo), contra os quais vários encantamentos foram escritos, já que um ælfġescot era capaz de causar enfermidades. Em Judith a personagem principal é dita como tendo uma ælfscyne, uma beleza ou brilho de elfo, capaz de seduzir, possivelmente uma atração fatal - a própria Judith mata Holofernes após embebedá-lo e encontrar-se sozinha com ele em seus aposentos.

Existem mais diferenças. Estas apenas algumas das mais importantes.

You Might Also Like

0 Comments

Curta no Facebook